sábado, 6 de julho de 2013

A força de um bom elenco


As telenovelas geralmente são vistas como entretenimento vazio e barato, recebendo o rótulo de ovelhas negras da cultura. Posto isso, a telenovela “Cordel Encantado”, atualmente produzida/exibida pela TV Globo no horário das 18h, é um interessante exemplo de como esse gênero pode ser feito com qualidade.
Bebendo de elementos da cultura popular nordestina, com destaque para o cangaço e o imaginário religioso, “Cordel Encantado” conta a história de Açucena/Aurora (Bianca Bin), uma princesa europeia que foi criada no sertão nordestino por pais adotivos. A trama gira em torno do amor de Açucena e Jesuíno (Cauã Reymond), amor que precisa lutar contra o fato de que a moça, enquanto princesa, está prometida ao Príncipe Felipe (Jayme Matarazzo). Açucena e Jesuíno também precisam lutar contra o Coronel Timóteo Cabral (Bruno Gagliasso), homem cruel e que ama Açucena.
Muito pode ser discutido sobre a correspondência ou não da novela em relação à “verdade” dos fatos históricos. Apesar disso, “Cordel Encantado” possui qualidades que merecem ser valorizadas. Há que se elogiar a fotografia (imagens de cinema), o texto (bastante poético, misturando comédia e drama) e a trilha sonora, que traz o melhor dos ritmos nordestinos marcados por zabumbas e pífanos. Mas o grande trunfo de Cordel Encantado está na qualidade do seu elenco. Os jovens Cauã Reymond, Bianca Bin, Nathalia Dill e Jayme Matarazzo presenteiam o telespectador com atuações convincentes. Também merecem destaque os desempenhos dos veteranos Osmar Prado, no papel do delegado Batoré, e Marcos Caruso, como o prefeito Patácio, responsáveis por muitos momentos cômicos da trama.
Bruno Gagliasso, no melhor papel de sua vida, está impecável como Timóteo, personagem que possui os traços de uma mente louca, má, egocêntrica, vaidosa e mimada. Domingos Montagner, no papel de Capitão Herculano, também merece elogios, uma vez que constrói seu personagem com boas doses de masculinidade e valentia, fazendo do chefe dos cangaceiros um homem que seduz o telespectador.
Bem feita e contando com um elenco que não decepciona em nenhum momento, pois até os atores com mínima participação são bons, Cordel Encantado merece ser vista e apreciada por todos os que gostam de uma teledramaturgia bem realizada.

Texto originalmente publicado na Coluna do Nehac do Jornal Correio de Uberlândia no dia 12 de agosto de 2011.

“Foi mal”


“Errar é humano”, nos diz a sabedoria popular. De fato, é impossível para qualquer ser humano atingir a perfeição, não conseguimos acertar sempre, às vezes magoamos outras pessoas. “Perdoar é divino”, nos lembra a mesma sabedoria popular. Perdoar é um ato de amor, uma atitude nem sempre fácil de tomar, mas sempre útil para que possamos seguir em frente no dia a dia, sem mágoas.
Contudo, os problemas surgem quando o ato de perdoar passa a ser visto por muitos como uma obrigação em si mesmo: aquele seu amigo pisa na bola, vai até sua casa para te pedir desculpas e você tem que perdoá-lo. Se não o perdoar, será rotulado como uma pessoa rancorosa, sem Deus no coração. O perdão não pode ser uma obrigação, pois, se o for, as pessoas não deixarão de cometer os mesmos erros. “Não há nada de mau se eu fizer isso, se ele não gostar, eu vou lá, peço desculpas e ficará tudo bem de novo”, certamente pensam muitas pessoas.
A filósofa Hannah Arendt afirmou com razão no livro “A Condição Humana” que o perdão não é uma faculdade isolada, mas forma um par com outra faculdade: a de prometer e cumprir promessas. Segundo a autora, as ações humanas são irreversíveis e imprevisíveis, ou seja, é impossível voltar ao passado e desfazer o que foi feito, as nossas ações muitas vezes levam a consequências que somos incapazes de prever. Por isso, se alguém nos pede desculpas por uma falha, devemos perdoar, mas a pessoa que nos magoou deve prometer e cumprir uma promessa, ou seja, tem que se comprometer a mudar suas atitudes.
Infelizmente, para muitas pessoas é mais fácil dizer “foi mal” do que se comprometer a mudar o próprio comportamento. Há gente que até promete mudar, mas não muda. O perdão, por si só, não contribui para que melhoremos as nossas relações com as outras pessoas. Para se viver bem em sociedade, não basta pedir desculpas, é preciso estar disposto a aprender com os próprios erros e a transformar as próprias práticas. O perdão deve ser dado a quem o merece.
Ninguém é perfeito, em alguns momentos as pessoas vão nos magoar, assim como nós também vamos errar com os outros. Que tenhamos a capacidade de aprender cada vez mais a agir bem com os outros, só assim seremos merecedores do perdão que nos libertará das nossas falhas.

Texto originalmente publicado na Coluna do Nehac do Jornal Correio de Uberlândia no dia 09 de março de 2012.

Sobre a questão ambiental


Nos últimos dias o Brasil se tornou o centro mundial dos debates em torno da questão ambiental e do desenvolvimento sustentável. A cidade do Rio de Janeiro recebeu a “Rio+20 – Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável”. E não foi a primeira vez que a ONU organizou um evento desse tipo. Há 20 anos, a mesma cidade do Rio de Janeiro recebeu a “Rio-92”, e há 40 anos o encontro foi realizado em Estocolmo, na Suécia.
O fato é que o debate em torno da necessidade de se preservar o meio ambiente e procurar um desenvolvimento sustentável tem se arrastado por décadas. Infelizmente, na prática, toda essa discussão gerou poucos frutos. Os chamados países desenvolvidos não se mostram muito dispostos a modificar o seu modelo de desenvolvimento e progresso, pois isso “traria perdas para as suas economias”. Os chamados países em desenvolvimento, por sua vez, “precisam se desenvolver rapidamente”, de modo a acabar com a pobreza e alcançar o mesmo “nível” dos países desenvolvidos.
A realização de grandes conferências sobre o desenvolvimento sustentável é importante, pois discute o assunto e alerta para o fato de que os recursos naturais do planeta são finitos. Contudo, sinto falta de que todos os “discursos em prol do meio ambiente” sejam colocados, efetivamente, em prática. Enquanto interesses econômicos e políticos (principalmente de países como Estados Unidos e China, que são dois grandes poluidores) estiverem em primeiro plano, o planeta continuará sofrendo com um modelo de desenvolvimento que precisa ser urgentemente repensado.
Em tempos de crise econômica a nível global, é certo que muitos países estejam ansiosos por acelerar as rodas de suas economias, neste contexto “o meio ambiente pode ficar para depois”. Contudo, é preciso ter consciência de que, mais cedo ou mais tarde, pagaremos a conta por essa postura (na verdade, acredito até que já estamos pagando).
Atualmente está na moda discursar a favor do “ecologicamente correto”. Mas quando eu vejo, por exemplo, pessoas desperdiçando água, questiono a utilidade de tanta discussão sobre o desenvolvimento sustentável. Espero que as pessoas, as indústrias e os governos parem de discursar e mudem suas práticas. Tomara que o planeta dure até isso acontecer!

Texto originalmente publicado na Coluna do Nehac do Jornal Correio de Uberlândia no dia 22 de junho de 2012.

Regulamentação da Profissão de Historiador


No último dia 7 de novembro o Senado aprovou o projeto de lei PLS 368/09, do senador Paulo Paim (PT-RS), que regulamenta a profissão de historiador no Brasil. O projeto propõe que o exercício da profissão deve ser privativo dos diplomados em cursos de graduação, mestrado ou doutorado em História.
Trata-se de um tema polêmico. Mesmo entre os historiadores, não há um consenso absoluto a respeito da regulamentação. Enquanto uns se posicionam a favor do projeto de lei, outros se mostram contrários a tal medida. A discussão se tornou ainda mais intensa quando, no último dia 10 de novembro, Fernando Rodrigues chamou o projeto PLS 368/09 de “estapafúrdio” na Folha de São Paulo. O jornalista também afirmou que tal lei, se for aprovada também na Câmara e sancionada pela presidente, impedirá que pessoas qualificadas, oriundas de outras áreas do conhecimento, possam dar aulas de História.
Tal fato provocou uma forte reação entre alguns historiadores, entre os quais o próprio presidente da Associação Nacional de História (ANPUH), Benito Bisso Schmidt. Em carta publicada no Facebook, Schmidt disse que Fernando Rodrigues não leu o projeto de lei antes de escrever a respeito. Além disso, Schmidt ressaltou que, ao longo da formação acadêmica na área, os historiadores “desenvolvem habilidades específicas como a crítica documental e historiográfica e a aquisição de conhecimentos teóricos, metodológicos e técnicos imprescindíveis à investigação científica do passado”.
O debate sobre a exigência de um diploma específico para o exercício da profissão de historiador levanta uma questão importante: afinal de contas, o que é preciso para ser um historiador? A História, enquanto forma de conhecimento, possui uma história longa e complexa. Há várias concepções sobre o que é “história”, qual sua “função”, quais devem ser os seus “métodos” de pesquisa e escrita, sendo que muitas dessas noções mudaram ao longo do tempo – e vão certamente continuar mudando.
Antes de tomarmos partido dentro do debate a respeito do projeto de lei PLS 368/09, temos que ter em mente a complexidade que envolve a área de História. Trata-se de uma disciplina que, se tem limites, também dialoga constantemente com outras áreas, científicas e artísticas. Como disse Paul Veyne, “O perigo com a história é que ela parece fácil e não o é”. Em outras palavras, a História não é tão simples como pensam algumas pessoas…

Texto originalmente publicado na Coluna do Nehac do Jornal Correio de Uberlândia no dia 16 de novembro de 2012.

Morgan Freeman e a “Consciência Negra”


Estamos no último dia do mês de novembro e, nas últimas semanas, pudemos acompanhar os debates acerca do dia da “Consciência Negra”. Trata-se do dia 20 de novembro, data na qual são discutidos temas como o racismo e o papel dos negros na história e na sociedade brasileira.
Recentemente, o trecho de uma entrevista do ator norte-americano Morgan Freeman circulou nas redes sociais, especialmente no Facebook. No vídeo, quando questionado sobre o que acha do “Mês da Consciência Negra”, Freeman responde: “Ridículo”. Na sequência, o ator argumenta que não se deve confinar toda a história dos negros a um único mês e salienta que não há um “mês da consciência branca”. Por fim, ele afirma que, para se acabar com o racismo, é preciso parar de falar nele: “Eu vou parar de chamá-lo de branco… E o que eu lhe peço, é que pare de me chamar de… negro!”, ele disse.
Muitas pessoas que divulgaram esse trecho da entrevista de Morgan Freeman se limitaram a usá-lo como “argumento” para criticar a existência do “Mês da Consciência Negra”. Duas observações devem ser feitas aqui: em primeiro lugar, o vídeo foi tirado do seu contexto, e poucas pessoas se questionaram sobre a entrevista na íntegra e sobre o lugar de onde Freeman fala. Em segundo lugar, parte considerável dessas pessoas não percebeu algo importante: o que Freeman propõe não é pura e simplesmente um esquecimento do racismo, mas sim que as pessoas parem de ser identificadas pela cor da pele. No mundo idealizado por Morgan Freeman, a formação das identidades individuais e coletivas não deve ter a cor da pele como fator determinante.
Particularmente, eu adoraria viver nesse mundo proposto por Morgan Freeman, mas, infelizmente, eu não vivo. A minha sociedade é, sim, racista e penso que não devemos parar de falar a respeito. Acredito que datas como o dia da “Consciência Negra” são sim importantes, desde que estimulem as pessoas a uma reflexão profunda sobre o racismo, onde a problematização dos processos de construção das identidades é fundamental.
Infelizmente, o que se viu no Facebook nos últimos dias, na maioria das vezes, foi uma discussão rasa e simplista. Entre pensar criticamente sobre o tema e simplesmente clicar para “Compartilhar” o vídeo de Freeman, muitos optaram pelo clique. O que o astro de “Conduzindo Miss Daisy” acharia disso?

Texto originalmente publicado na Coluna do Nehac do Jornal Correio de Uberlândia no dia 30 de novembro de 2012.

sexta-feira, 5 de julho de 2013

30 anos de “War”


Em 2013, o álbum “War”, da banda irlandesa U2, completa 30 anos. Lançado em 1983 e produzido pelo lendário produtor Steve Lillywhite, “War” pode ser considerado um dos grandes discos do U2. A capa mostra o rosto do garoto Peter Rowen olhando-nos de maneira desafiadora, dura, furiosa. O preto e branco da imagem contrasta com as palavras “U2” e “War” (“Guerra”, em português), escritas com uma vermelha cor de sangue no lado direito da capa.
É interessante percebermos a diferença entre as capas de “Boy” (o primeiro disco do U2, lançado em 1980) e “War”. Peter Rowen também aparecera na capa do álbum de estreia do U2, mas a sua expressão facial fora mais infantil, e não a ameaçadora que pode ser vista na capa do disco de 1983. Não só os aspectos visuais dos discos são diferentes, mas a sonoridade das músicas e o teor das composições também passaram por algumas mudanças.
“War” é um disco mais maduro, onde se destaca a presença mais intensa e direta da temática política nas canções. A primeira faixa do disco é “Sunday Bloody Sunday”, na qual o som da bateria de Larry Mullen Jr. se assemelha ao de uma metralhadora. A letra é uma referência ao Domingo Sangrento, de 1972, no qual houve um confronto entre manifestantes católicos e o exército inglês, na Irlanda do Norte. “Sunday Bloody Sunday” é um protesto contra a violência e a intolerância. Outras faixas do disco também merecem a nossa atenção, tais como “New Year’s Day”, “Like a Song…”, “Two Hearts Beat as One” e “40”.

“War” é um disco que está intimamente ligado ao momento histórico no qual foi produzido: a invasão soviética ao Afeganistão, o movimento “Solidariedade” na Polônia, as eleições de Ronald Reagan, nos EUA, e de Margaret Thatcher, no Reino Unido, a guerra das Malvinas, o terrorismo do IRA, o desemprego na Irlanda etc. “War” surgiu a partir daquele contexto de violência, brutalidade e degradação, e suas músicas são um protesto contra a situação vivenciada naquele momento.
“Um tapa na cara”, assim o vocalista Bono definiu o disco. De fato, “War” é mesmo um álbum provocador, tendo recusado o escapismo comum a outras bandas da época. Mais que isso, este disco é um marco na trajetória do U2, uma banda que se preocuparia cada vez mais, nas décadas seguintes, com temas políticos e sociais, sempre presentes em seus discos. Aliás, tais temáticas têm servido não só à criação artística da banda, mas também como uma eficiente forma de marketing do grupo.

Texto originalmente publicado na Coluna do Nehac do Jornal Correio de Uberlândia no dia 01 de março de 2013.

O Universo dos Doramas


As sociedades ocidentais recebem, há anos, vários elementos oriundos das culturas orientais. De artes marciais a conteúdos filosóficos, passando por mangás, filmes, músicas e moda, diversos produtos culturais oriundos de países como Japão, Coreia do Sul e China chegam até nós e conquistam fãs e adeptos. Em tempos de internet, esse processo fica cada vez mais visível, haja vista o exemplo do sucesso alcançado pela canção “Gangnam Style”, do sul-coreano Psy, no mundo todo.
O fato é que, no campo das trocas culturais que permeiam o concerto das nações, os países orientais têm conquistado cada vez mais visibilidade e destaque, algo que certamente vai ao encontro do papel desempenhado por eles na economia contemporânea.
Sob esse prisma, há um tipo de produção oriental que tem chamado a atenção no Ocidente: os “doramas”. Este é o nome usado para designar as séries televisivas produzidas no Japão (os J-Dramas), na Coreia do Sul (os K-Dramas), na China (os C-Dramas) e assim por diante. Os doramas formam um universo bastante particular e têm muito a mostrar das culturas orientais.
Marcados por uma forte carga dramática, os doramas alternam entre momentos de tristeza e de intensa excitação, provocando lágrimas e gargalhadas em quem assiste. Seja em histórias ambientadas no tempo presente seja naquelas ambientadas no passado, essas séries tratam de temas como amor, amizade, a busca pela felicidade e os papéis a serem desempenhados por homens e mulheres nas sociedades orientais.
Não espere ver muitas cenas de beijos nem muitas cenas de carícias e contato físico intenso nos doramas. Nessas produções, os sentimentos dos personagens são revelados e explicitados mais pela força do olhar e pelos expressivos diálogos. Também são comuns cenas de funerais que se desenrolam durante uma chuva, bem como a noção de que as pessoas são destinadas umas às outras.
Doramas como “Aka Faith”, “Arang and the Magistrate”, “To the Beautiful You”, “Boys over Flowers” e “Personal Taste” são disponibilizados gratuitamente na internet, havendo também comunidades online de fãs que trocam informações, divulgam e também traduzem os episódios para diversas línguas. Cativante, o universo dos doramas tem chamado a atenção de pessoas em vários países do mundo, incluindo o Brasil. Vale a pena conferir!

Texto originalmente publicado na Coluna do Nehac do Jornal Correio de Uberlândia no dia 05 de abril de 2013.

A crítica de cinema em tempos de internet


Os interessados em cinema encontram na internet um amplo conteúdo sobre filmes. Sites especializados oferecem muito material de pesquisa para os amantes da sétima arte e também para os estudiosos. Nesse cenário, a crítica de cinema ganha novos espaços, não mais restritos aos jornais e revistas impressos das décadas passadas. Com o crescente aumento do acesso à internet, podemos dizer que os críticos de cinema hoje conseguem alcançar uma quantidade cada vez maior de leitores.
O internauta vê em casa os horários de exibição de um filme e já dá uma olhada nos comentários acerca da obra disponíveis na rede mundial de computadores. Seja nas mídias impressas, seja nas mídias virtuais, o que podemos verificar é que a crítica de cinema muitas vezes interfere na recepção dos filmes por parte do grande público. Como o historiador Alcides Freire Ramos afirma no livro “Canibalismo dos Fracos” (2002), “o crítico possui um papel importante no que se refere à formação da opinião sobre os filmes”.
Posto isso, há algo preocupante que podemos observar na internet: a repetição desvairada das ideias e colocações dos críticos de cinema por parte de muitos espectadores, especialmente nas redes sociais. Sites como o “Cinema com Rapadura”, por exemplo, que divulga críticas de filmes, muitas delas interessantes, diga-se de passagem, oferecem um prato cheio para os papagaios de plantão na web. Nestes tempos de internet, onde impera o “copiar e colar”, a criatividade e a autonomia de pensamento parecem estar fora de moda.
É espantoso ver universitários que se dizem “cinéfilos” e “intelectuais” reproduzindo descaradamente, palavra por palavra, sem dar os devidos créditos às fontes, o que os textos de crítica de cinema dizem sobre certos filmes, não se arriscando a uma interpretação própria das obras. Como afirma Alcides Freire Ramos no livro, “a crítica de cinema não é neutra”. Em outras palavras, os críticos não são donos de uma verdade absoluta sobre os filmes, é preciso ler seus textos de maneira cuidadosa, verificando os méritos e as limitações das análises.
Ler a crítica especializada é um passo importante para entendermos o significado que os filmes adquirem em determinados contextos. Contudo, apenas reproduzir, cega e apressadamente, o que os críticos dizem sobre as películas é, na minha avaliação, um exercício “intelectual” bastante ingênuo e pobre.

Texto originalmente publicado na Coluna do Nehac do Jornal Correio de Uberlândia no dia 17 de maio de 2013.

Ladrões “milagreiros”


Há vários anos a dupla sertaneja Zilo & Zalo gravou uma canção chamada “O Milagre do ladrão”. A história contada pela música é comovente. Um menino paraplégico ouve de sua mãe que um dia Jesus Cristo virá curá-lo. Quando um ladrão invade a casa do menino, o garoto pensa que aquele estranho é Jesus, levanta-se da cama e caminha até ele. “O inocente no momento foi curado, sem perceber que era o milagre de um ladrão”, cantam Zilo & Zalo ao fim da música. Uma canção sobre o poder da fé, e também sobre a ingenuidade e a inocência de uma criança.
De uns anos para cá temos acompanhado o aumento do número de novas igrejas, bem como a expansão de instituições religiosas mais antigas. Tem sido espantoso ver que em muitas dessas instituições existem verdadeiros ladrões, pessoas interessadas unicamente em explorar a fé, a inocência e a ingenuidade dos fieis. São líderes religiosos que almejam, no fundo, apenas o enriquecimento pessoal. Sob o disfarce de “homens de Deus”, tais lideranças querem somente o dinheiro dos outros.
Pessoas que enfrentam diversos problemas – doenças, dificuldades financeiras, dependentes químicos na família, falta de sorte no amor etc – são atraídas por representantes de tais religiões que prometem a solução para todos esses obstáculos, desde que haja uma contribuição financeira por parte daquele que quer “mudar de vida”.
Sedutores, muitos desses líderes religiosos usam até programas de TV para “vender o seu produto”. E eles sabem bem como projetar a voz, como gesticular e como controlar suas expressões faciais na telinha. E convencem os fiéis! Fragilizadas pelos problemas cotidianos da vida, muitas pessoas acabam “comprando o peixe” desses mercadores da fé, por vezes a altos preços. E se determinado problema é superado, o fiel acaba creditando todos os méritos à sua igreja, ao seu líder, e não ao próprio esforço pessoal ou a outros fatores.
Muitos inocentes estão sendo curados por aí, e não estão percebendo que os “milagres” são operados por pessoas ainda mais mal intencionadas que o ladrão da música de Zilo & Zalo. A fé não tem movido apenas montanhas, mas também tem movimentado muito dinheiro. E quem está realmente lucrando com isso?
Quanto a mim, faço minhas as palavras do próprio Cristo: “Não transformem a casa de meu Pai num mercado”. Mesmo porque a minha ligação com Deus dispensa atravessadores…

Texto originalmente publicado na Coluna do Nehac do Jornal Correio de Uberlândia no dia 05 de julho de 2013.