sexta-feira, 27 de março de 2015

Sobre a “imparcialidade” da imprensa

Nos últimos meses, as publicações de teor político se multiplicaram nas redes sociais, onde as pessoas se manifestam a favor ou contra o governo. As postagens no Facebook dialogam com o conteúdo veiculado pela imprensa. Enquanto algumas pessoas simplesmente reproduzem as informações transmitidas pelos veículos de comunicação, outras acusam a grande mídia de “tomar partido” nos debates políticos. Mas é possível existir imparcialidade na imprensa?
Analisemos a forma padrão dos telejornais. Atrás de uma bancada, bem vestidos e, na maior parte das vezes, com expressão séria estão os âncoras. Uma reportagem é chamada e há um corte para o repórter que está em algum local, realizando a sua matéria. O repórter está fora do estúdio para confirmar “in loco” o que foi anunciado na bancada. O telespectador raramente é informado da real localização do estúdio de gravação do telejornal. É como se os apresentadores estivessem em um ambiente neutro, afastado da realidade. Parece não haver dúvida: as informações são transmitidas de maneira imparcial.
Todavia, por trás dessa aparente neutralidade, sempre há uma posição política sendo assumida. A ordem em que as matérias são exibidas, a duração de cada reportagem, as notícias que não são divulgadas e os adjetivos usados nas falas dos apresentadores e dos repórteres não são aspectos definidos de maneira inocente pelos editores do telejornal. O mesmo vale para as revistas, os jornais impressos e os sites de notícias. Aquele que transmite informações pela mídia nunca pode apagar completamente o seu ponto de vista ou o ponto de vista da corporação para a qual trabalha, seja ele favorável ou crítico ao governo.
“Mas a imprensa não pode mentir, senão o jornalista será processado por calúnia e difamação”, dizem alguns. É claro que o jornalismo feito com responsabilidade tomará certos cuidados antes de veicular uma informação. Contudo, é preciso que não sejamos ingênuos, pois existem muitas formas de se contar uma mesma “verdade”, e cada uma delas é carregada de intenções.
O fato de a imprensa “tomar partido” não me amedronta. Isso é normal e, em uma democracia, é até bom que seja assim. O que realmente me assusta é a falta de capacidade crítica de muitos leitores e telespectadores que acreditam em tudo o que é veiculado pela mídia.
(Texto originalmente publicado na Coluna do NEHAC do Jornal Correio de Uberlândia no dia 27 de março de 2015.)

sexta-feira, 20 de março de 2015

MacGyver

A vida muitas vezes nos coloca em situações difíceis, das quais parece não haver saída. E o que fazemos quando nos deparamos com determinados obstáculos, quando nos vemos presos em certas armadilhas? Como reagimos em situações complicadas? Acredito que pensar sobre tais questões é importante, ainda mais quando se vive em um mundo tão desafiador como o nosso.
Gosto de lembrar sempre o seriado “MacGyver” (também chamado de “Profissão: Perigo”), que surgiu na TV americana nos anos 1980 e, tempos depois, chegou ao Brasil. O seu protagonista era o agente Angus MacGyver (Richard Dean Anderson), um homem extremamente inteligente, capaz de encontrar a solução para os mais variados problemas. Algo que eu gostava em “MacGyver” eram as ferramentas criadas pelo personagem principal para conseguir escapar de alguma armadilha ou de um lugar perigoso, tais como as famosas bombas com chiclete.
Todavia, não era a inteligência do personagem o que mais me chamava a atenção, mas a forma como ele lidava com as situações mais tensas. Antes de fazer qualquer coisa, MacGyver procurava se manter calmo. Não importava o tamanho do perigo, ele se mantinha bastante sereno, sempre disposto a pensar antes de agir. Outra característica interessante do personagem era o fato de que ele não perdia tempo reclamando da falta de determinada ferramenta. MacGyver sempre preferia olhar para o que ele tinha ao alcance de suas mãos e trabalhava com sua criatividade em cima dos recursos disponíveis.
Não importa que certos mecanismos criados por MacGyver desafiem a imaginação do espectador. O fato é que a postura do protagonista diante das dificuldades e dos perigos é inspiradora. Quanta energia não devemos perder quando nos descabelamos diante de determinados problemas? E aonde tal desespero nos leva? Normalmente, a lugar nenhum. Já parou para pensar no tempo que você perde quando fica só reclamando ao dizer coisas como, “Mas eu não consigo fazer isso porque eu não tenho os materiais necessários”? E enquanto ficamos sem ação, os problemas vão só aumentando…
Ao longo da vida, aprendi que reclamações excessivas e desespero sem limites não adiantam nada. Em um mundo, muitas vezes hostil, é preciso olhar ao redor e valorizar os recursos disponíveis, manter a calma e usar a criatividade, afinal, a solução para nossos problemas pode estar mais perto do que pensamos.
Que sejamos um pouquinho como MacGyver!
(Texto originalmente publicado na Coluna do Nehac do Jornal Correio de Uberlândia no dia 11 de julho de 2014.)

Sobre "Pão e Circo"

A Copa do Mundo de 2014, que está acontecendo no Brasil, tem sido tema de uma série de debates na imprensa, nas rodas de amigos e nas redes sociais, onde observa-se algumas críticas ao torneio, sobretudo em relação aos exorbitantes gastos com a competição.
Entre os que criticam a Copa do Mundo é comum percebermos o uso da expressão “pão e circo” para classificar o evento, que é visto por essa perspectiva como um meio de o governo brasileiro entreter o povo e fazer com que as pessoas se esqueçam dos problemas do nosso país. Ora, a ideia de “pão e circo” nos remete, entre outras coisas, aos espetáculos que ocorriam na Roma antiga onde o público assistia aos combates entre gladiadores. Nos livros didáticos e no senso comum, tais espetáculos são geralmente vistos como uma eficaz estratégia dos detentores do poder para entreter a massa popular de Roma. Assim, quando aqueles que criticam a Copa do Mundo no Brasil a rotulam como “pão e circo” é justamente essa imagem cristalizada na memória coletiva acerca das lutas de gladiadores que é retomada.
Todavia, quando se estuda aqueles espetáculos antigos, encontra-se elementos que nos permitem repensar tal noção de “pão e circo”. No livro “Gladiadores na Roma Antiga: dos combates às paixões cotidianas” (2005), a historiadora brasileira Renata Senna Garraffoni nos mostra como foi construída ao longo do tempo essa imagem dos combates entre gladiadores como um meio usado pelas elites para divertir e manter sob controle a massa popular ociosa romana.
A partir disso, a autora se esforça para demonstrar a complexidade que envolvia aqueles eventos. Por meio de uma ampla pesquisa documental, Garraffoni concentra seu estudo na figura dos gladiadores, na organização das lutas, nos diversos atores sociais envolvidos no processo, etc. Mais que isso, a autora apresenta um dado desconhecido por muitos: o público que assistia àquelas lutas não era homogêneo, nem passivo, mas formado por pessoas de distintas origens e que até se manifestavam politicamente nas arquibancadas das arenas.
Como se vê, a ideia cristalizada de “pão e circo” presente no senso comum sobre as lutas de gladiadores na Roma antiga não nos permite vislumbrar a complexidade daqueles espetáculos. Aqui fica uma pergunta: se as lutas de gladiadores eram um fenômeno tão complexo, o que dizer então da Copa do Mundo dos dias de hoje? Penso que críticas ao evento da Fifa devem, sim, ser feitas, mas usar a expressão “pão e circo” sem uma reflexão mais aprofundada sobre a sua história e sobre os seus significados não me parece ser um caminho interessante.
(Texto originalmente publicado na Coluna do Nehac do Jornal Correio de Uberlândia no dia 27 de junho de 2014.)

"Colheita Maldita"

Talvez você já tenha se perguntado: e se o mundo fosse governado por crianças? Eu mesmo já me fiz essa pergunta quando era pequeno e a imagem de um mundo melhor veio à minha cabeça. Contudo, uma perspectiva bem diferente acerca de tal questão me foi apresentada no início da adolescência pelo filme “A colheita maldita” (1984, direção de Fritz Kiersch).
No filme, uma pequena cidade do interior dos Estados Unidos passa a ser controlada por crianças e adolescentes. Baseado em um conto do escritor norte-americano Stephen King, “A colheita maldita” elabora uma imagem bastante negativa de uma sociedade governada por crianças. Com elas no comando, a cidade se vê entregue à violência, ao terror e aos caprichos dos mais jovens que, aliás, chegam a matar os próprios pais. A obra até explica que aqueles meninos e meninas estão sob o domínio de uma força sobrenatural maligna, mas, ainda assim, a imagem que se tem das personagens infantis e adolescentes é de pessoas mimadas. Segundo o filme, não há um mundo melhor com as crianças no poder, mas justamente o contrário: um cenário de completo horror.
Guardadas as devidas proporções, o fato é que essa obra de ficção me faz pensar na educação de nossas crianças e de nossos jovens atualmente. O que se tem visto em muitas famílias brasileiras são pais e mães completamente dominados pelos filhos. Talvez como uma compensação pelo longo período passado fora de casa, no trabalho, muitos pais têm dado a seus filhos uma educação bastante permissiva, impondo poucos limites às vontades das crianças ou até mesmo nenhum. Não por acaso, psicólogos têm usado o termo “infantocracia” exatamente para descrever a situação na qual os filhos governam os pais e mandam em casa. As crianças estão assumindo o controle em muitos lares.
Não creio que essa seja uma boa forma de plantar um futuro melhor para a nossa sociedade. De fato, alguns frutos dessa verdadeira “colheita maldita” já podem ser vistos cotidianamente: crianças e adolescentes que não sabem ouvir um “não” e que ficam extremamente tristes ou irritados quando a vida coloca uma frustração em seu caminho, muitas vezes respondendo até com violência às decepções.
Lutar contra tal processo é uma tarefa da qual os pais não devem fugir. Afinal, uma boa educação não se faz apenas com colégios caros, conforto, amor, diálogo e muito carinho, mas também com limites. As crianças não devem crescer pensando que podem fazer tudo o que querem.
(Texto originalmente publicado na Coluna do Nehac do Jornal Correio de Uberlândia no dia 25 de abril de 2014.)

Biblioteca Escolar


Há algumas semanas um amigo publicou no Facebook uma estatística que me fez pensar no hábito da leitura e na minha relação pessoal com os livros. Segundo a postagem, “87% dos não leitores nunca foram presenteados com livros na infância”. Ao me deparar com tal informação foi impossível não rememorar a minha trajetória pessoal.

Pois bem, nunca ganhei um livro sequer na minha infância e devo dizer que os estímulos à leitura eram bastante raros naquele período de minha vida. E, no entanto, eu desenvolvi uma verdadeira paixão pela leitura, de modo que hoje os livros fazem parte do meu cotidiano de maneira bastante intensa. Com efeito, creio que o surgimento do hábito da leitura não depende apenas do fato de se ganhar livros, afinal, a própria pesquisa “Retratos da Leitura no Brasil” (2011), de onde a estatística que citamos no início deste texto foi tirada, informa que 60% dos leitores também nunca foram presenteados com livros.

Como se vê, o fato de não ganhar livros não impede totalmente que o gosto pela leitura apareça. Mas, se o estímulo a esse hábito tão importante não vem de casa e nem dos amigos, de onde ele pode vir? É aqui que rememoro a minha trajetória pessoal. No meu caso, ler tornou-se um hábito a partir de 1999, quando fui estudar na Escola Estadual Professor Vicente Lopes Perez, situada na cidade de Monte Carmelo (MG). Naquele colégio, conhecido por “Polivalente”, havia uma bem organizada biblioteca escolar localizada em um ponto estratégico e que contava com bibliotecárias atenciosas. Aquele era um lugar confortável para se estar, que convidava o aluno a entrar e o estimulava a explorar o acervo de livros ali existente.

Penso que este deve ser um exemplo para as bibliotecas de nossas escolas hoje. A biblioteca escolar precisa ser um lugar capaz de atrair o aluno. Infelizmente, em muitos de nossos estabelecimentos de ensino, estes espaços estão escondidos, não contam com uma organização eficiente e não são nada atraentes para os estudantes. Ora, se a criança ou o adolescente não tiver um estímulo à leitura nem em casa e nem na escola, aí sim acredito que esse hábito pode não surgir. Restará em casos assim, talvez, torcer para que o jovem adquira o gosto pela leitura por meio de outros caminhos.

No meu caso, a biblioteca escolar do Polivalente de Monte Carmelo foi fundamental na minha formação. Gosto de pensar que aquelas estantes cheias de livros mudaram a minha vida. Devo muito do que sou àquela biblioteca e deixo aqui registrada a minha profunda gratidão.

(Texto originalmente publicado na Coluna do Nehac do Jornal Correio de Uberlândia no dia 31 de janeiro de 2014.)

Confinados

A trajetória de João Batista de Andrade é bastante interessante. Nascido na cidade mineira de Ituiutaba em 1939, Andrade vivenciou complexos momentos da recente história do Brasil, como o período da Ditadura Militar (1964-1985), por exemplo, tendo uma notável carreira como cineasta. Já como escritor, publicou sete livros até o presente momento, o último se chama “Confinados: memórias de um tempo sem saídas” (Ed. Prumo, 2013, 192 páginas).
A obra se ocupa da atual realidade de nosso país e acompanha as vidas de alguns personagens que vivem em uma grande cidade brasileira, explorando seus problemas, seus dramas, suas crises e sua incapacidade de encontrar um caminho seguro nestes tempos de tantas dificuldades. “Confinados” apresenta ao leitor uma instigante mistura de realidade e ficção, e, em várias passagens, é possível perceber pontos de contato entre a história de vida do autor do livro e as histórias de seus personagens, como a do velho arquiteto Júlio, um homem em crise que sofre com sua solidão.
A sensação de solidão, aliás, é elemento importantíssimo de “Confinados”. A cidade grande é o espaço da violência e do medo, o que faz com que os personagens tenham que se trancar em suas casas, permanecendo sozinhos e vendo as tragédias da guerra entre policiais e bandidos pela TV. É a partir desta situação de confinamento, desta solidão, que Andrade explora os complexos aspectos psicológicos de seus personagens e nos apresenta a sua visão acerca do Brasil contemporâneo.
João Batista de Andrade militou por anos no Partido Comunista Brasileiro (PCB), lutou contra o regime militar por meio de sua arte e sempre apresentou em suas produções um olhar crítico sobre os (des)caminhos trilhados pela sociedade brasileira. Nesta perspectiva, “Confinados” é interessante porque nos permite ver como um autor com tal trajetória de vida interpreta o atual estado de coisas no nosso país. A pergunta feita por Andrade em seu livro, portanto, diz respeito tanto ao personagem Júlio quanto ao próprio autor: “Como falar do desconforto enorme, diante dos desafios e surpresas do mundo atual, depois do fim de suas utopias, depois de tantas lutas e esperanças que carregara desde a juventude?”.
Tal questionamento é importante, pois nos remete a todos aqueles que não conseguem encontrar no tempo presente a realização de projetos e sonhos do passado, mas apenas uma cruel e violenta realidade, um mundo no qual confinados estamos todos nós.
(Texto originalmente publicado na Coluna do Nehac do Jornal Correio de Uberlândia no dia 22 de novembro de 2013.)

Recursos audiovisuais e ensino de História

O meu trabalho como professor de ensino médio na Escola Estadual Messias Pedreiro, localizada na área central da cidade de Uberlândia, tem me proporcionado não só o contato com uma nova geração de jovens, mas também a oportunidade de pensar questões atinentes ao ensino de História, disciplina da qual sou professor. Sob esse prisma, tem me chamado a atenção o amplo conjunto de possibilidades do uso de recursos audiovisuais no processo de ensino e aprendizagem de História.
Há poucas semanas pedi aos meus alunos das turmas de segundo ano do ensino médio que se organizassem em grupos e apresentassem trabalhos sobre algumas revoltas ocorridas no campo e na cidade durante o início do século 20 no Brasil. Tais trabalhos foram apresentados nos últimos dias e fiquei realmente impressionado com a qualidade de muitos deles. Algo que merece destaque nesta experiência é o fato de que muitos dos meus alunos se mostraram extremamente hábeis em manusear equipamentos de som e vídeo para a apresentação dos trabalhos (uma habilidade que pode até assustar os mais velhos). Já na elaboração dos mesmos a pesquisa na internet se mostrou importante, não apenas na construção de textos mas também na montagem de vídeos e apresentações de slides, com imagens diversas e músicas encontradas na web.
Neste sentido, os alunos se mostraram capazes não só de realizar pesquisa histórica, mas também de apresenta-la aos colegas de maneira bastante agradável e, em certos casos, bastante divertida, pois alguns grupos usaram do bom humor nas apresentações. Tal experiência me mostrou o papel que pode ser desempenhado pelos recursos audiovisuais e as modernas tecnologias no ensino de História na atualidade. Os mais jovens são pessoas extremamente adaptadas a todo o aparato tecnológico moderno e a escola deve estar atenta a isso. O uso de tais recursos audiovisuais pode tornar o ensino mais dinâmico e prazeroso para os nossos alunos, uma vez que eles lidam tão bem com essas linguagens.
No caso do ensino de História, tal prática é interessante pois amplia consideravelmente a gama de materiais a serem trabalhados pelo professor em sala de aula, que não precisa mais – e nem deve – ficar restrito ao livro didático. Por fim, cabe salientar que não se deve esperar que a tecnologia faça o trabalho do professor, pois ele continua sendo um agente importantíssimo na educação, o profissional que deve orientar os alunos no uso dessas modernas ferramentas para a construção do conhecimento.
(Texto originalmente publicado na Coluna do Nehac do Jornal Correio de Uberlândia no dia 04 de outubro de 2013.)

O Cinema Alemão e a Ascensão de Hitler

Quando o assunto é o nazismo, muitos se perguntam: afinal de contas, como os alemães puderam apoiar Adolf Hitler? Trata-se de uma difícil questão, e muitos foram os estudiosos que tentaram respondê-la. Um deles foi Siegfried Kracauer, que em 1947 publicou o livro “De Caligari a Hitler: uma história psicológica do cinema alemão”. Escrita por um autor que teve que fugir da Alemanha nazista para Paris em 1933, indo depois para os Estados Unidos em 1941, a obra é um esforço de Kracauer em tentar entender o processo que levou Hitler ao poder.
A hipótese trabalhada no livro é instigante: havia entre os alemães um “mal-estar psicológico” já durante a década de 1910. Sob esse prisma, o autor se volta para as produções do cinema alemão das primeiras décadas do século 20 e afirma: “através de uma análise dos filmes alemães, pode-se expor as profundas tendências psicológicas predominantes na Alemanha de 1918 a 1933, tendências que influenciaram o curso dos acontecimentos no período de tempo acima mencionado”.
Kracauer analisa os aspectos estéticos e os temas recorrentes em tais produções e observa que muitos dos filmes da época contavam histórias sombrias, de homicídios, tiranos, violência, etc. Por ser o cinema uma arte coletiva voltada para o consumo das massas, o autor defende que tais aspectos do cinema alemão daquele período dialogavam perfeitamente com o “padrão psicológico vigente” na Alemanha, padrão esse que, segundo Kracauer, esteve intimamente relacionado tanto à ascensão de Hitler ao poder quanto ao holocausto.
O que dizer de tal hipótese? É certo que o livro foi publicado após a 2ª Guerra Mundial, quando os horrores do extermínio dos judeus já eram conhecidos. Neste sentido, por vezes, Kracauer parece procurar a qualquer custo paralelos entre as histórias contadas nos filmes e as histórias reais em torno do nazismo. Por outro lado, um filme como ‘ “Homunculus”, de 1916, chama a atenção ao contar a história de um sofrido homem que foi criado em um tubo de ensaio e que se torna ditador de um grande país, sendo o responsável por uma guerra mundial. Tais semelhanças com Hitler impressionam Kracauer, e também a nós, seus leitores.
Concordemos ou não com a análise feita nas páginas do livro, o fato é que o cinema alemão em suas primeiras décadas parece mesmo ter antecipado eventos atinentes ao nazismo. Como bem disse Kracauer, “importantes personagens cinematográficos se tornaram verdadeiros na vida real” da Alemanha. É mesmo para se pensar…
(Texto originalmente publicado na Coluna do NEHAC do Jornal Correio de Uberlândia de 16 de agosto de 2013.)