sexta-feira, 20 de março de 2015

Confinados

A trajetória de João Batista de Andrade é bastante interessante. Nascido na cidade mineira de Ituiutaba em 1939, Andrade vivenciou complexos momentos da recente história do Brasil, como o período da Ditadura Militar (1964-1985), por exemplo, tendo uma notável carreira como cineasta. Já como escritor, publicou sete livros até o presente momento, o último se chama “Confinados: memórias de um tempo sem saídas” (Ed. Prumo, 2013, 192 páginas).
A obra se ocupa da atual realidade de nosso país e acompanha as vidas de alguns personagens que vivem em uma grande cidade brasileira, explorando seus problemas, seus dramas, suas crises e sua incapacidade de encontrar um caminho seguro nestes tempos de tantas dificuldades. “Confinados” apresenta ao leitor uma instigante mistura de realidade e ficção, e, em várias passagens, é possível perceber pontos de contato entre a história de vida do autor do livro e as histórias de seus personagens, como a do velho arquiteto Júlio, um homem em crise que sofre com sua solidão.
A sensação de solidão, aliás, é elemento importantíssimo de “Confinados”. A cidade grande é o espaço da violência e do medo, o que faz com que os personagens tenham que se trancar em suas casas, permanecendo sozinhos e vendo as tragédias da guerra entre policiais e bandidos pela TV. É a partir desta situação de confinamento, desta solidão, que Andrade explora os complexos aspectos psicológicos de seus personagens e nos apresenta a sua visão acerca do Brasil contemporâneo.
João Batista de Andrade militou por anos no Partido Comunista Brasileiro (PCB), lutou contra o regime militar por meio de sua arte e sempre apresentou em suas produções um olhar crítico sobre os (des)caminhos trilhados pela sociedade brasileira. Nesta perspectiva, “Confinados” é interessante porque nos permite ver como um autor com tal trajetória de vida interpreta o atual estado de coisas no nosso país. A pergunta feita por Andrade em seu livro, portanto, diz respeito tanto ao personagem Júlio quanto ao próprio autor: “Como falar do desconforto enorme, diante dos desafios e surpresas do mundo atual, depois do fim de suas utopias, depois de tantas lutas e esperanças que carregara desde a juventude?”.
Tal questionamento é importante, pois nos remete a todos aqueles que não conseguem encontrar no tempo presente a realização de projetos e sonhos do passado, mas apenas uma cruel e violenta realidade, um mundo no qual confinados estamos todos nós.
(Texto originalmente publicado na Coluna do Nehac do Jornal Correio de Uberlândia no dia 22 de novembro de 2013.)

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