domingo, 22 de janeiro de 2017

Minha Vó Nega...


Ontem, dia 21 de janeiro, minha Vó Nega completou 78 anos de idade. Uma vida longa e que foi repleta até aqui de muitos desafios. Minha avó, como vocês podem imaginar, não nasceu "Nega", mas sim "Brasilina", o seu verdadeiro nome. De qualquer forma, ela é mais conhecida pelo apelido e, para mim, desde pequeno, ela sempre foi simplesmente a "Vó Nega".

Falar da minha avó é falar de uma mulher forte. Ela não teve uma vida fácil e foi com bastante luta que conseguiu criar os sete filhos ao lado do meu avô. É preciso lembrar que há algumas poucas décadas atrás, as pessoas não tinham certas comodidades que nos dias de hoje são tão corriqueiras. Disk-entrega? Isso não existia. Viajar para um lugar distante? Não era tão simples, já que o acesso a meios de transporte tinha as suas limitações. Comprar carne já devidamente cortada no açougue? Nem sempre, pois há algum tempo atrás se matava o animal - uma galinha, por exemplo - no quintal de casa mesmo, tinha que sujar as mãos para fazer o serviço. E o que mais... televisão, quando havia, só com poucos canais e a imagem era bem ruim - alguém tinha que mexer na antena lá fora até alguém gritar de dentro de casa para avisar que a imagem da TV tinha melhorado. Telefone celular? Não havia. Rua asfaltada na porta de casa? Este luxo só veio com o tempo, e antes disso as pessoas tinham que encarar a poeira e o barro.

A vida moderna trouxe alguns pequenos confortos. Não para todo mundo, é verdade, pois ainda hoje há pessoas que vivem sob condições sofríveis de vida. Porém, o que eu estou querendo dizer é que, ao longo de quase oitenta anos, minha avó - ao lado do meu avô, do meu pai e dos meus tios - teve que enfrentar uma realidade muito diferente da atual, com desafios complexos e muitas dificuldades que os mais jovens de hoje talvez nem imaginam.

Minha Vó Nega teve que se desdobrar para encarar as intempéries da vida. A ordem natural das coisas foi invertida, e ela teve que vivenciar uma terrível perda para qualquer mãe: a morte de um filho. O meu pai morreu muito jovem, e eu sei que passar por isso não foi fácil para a minha avó. Quando eu era criança e o assunto da morte do meu pai era abordado em alguma conversa, o seu olhar e a sua fisionomia sempre mudavam. Quem de nós poderá dimensionar o tamanho dessa dor? Provavelmente, ninguém além de Deus.

Ainda assim, desde a infância, a minha avó me surpreendeu por sua força e sua determinação. Procurava cuidar de tudo e de todos. Muito atenta, poucas coisas escapavam aos seus olhos e aos seus ouvidos. Dona de uma sinceridade e de um senso de humor por vezes ácido - o que, devo dizer, sempre foi algo que me agradou muito nela -, minha Vó Nega nunca foi de ter papas na língua e nunca perdeu a oportunidade de fazer uma graça, contar um causo engraçado ou tecer algum inesperado comentário sobre uma celebridade da TV. Certa vez, quando assistíamos juntos a um telejornal, ela elogiou a beleza do apresentador da seguinte maneira: "Esse Evaristo Costa é bonito demais, um pão... Nossa, acho que até o c* dele deve ser bonito!". E depois de falar já começava a rir deliciosamente no sofá da sala. Que divertido era e ainda é ouvir esses comentários feitos por ela! Minha Vó Nega sempre foi uma grande figura, e isto é algo que ninguém pode mudar.

Ela também é dona de uma grande sabedoria. Quantas vezes eu já tive a oportunidade de conversar com ela por longas e longas horas, nais quais sempre pude aprender muito sobre as coisas da vida. Minha avó é uma pessoa que sabe falar e ouvir, e com ela dá para conversar sobre religião, finanças, política, telenovelas, família, atualidades, culinária, etc. Dona Nega sempre está pronta para uma boa conversa, mas ela gosta de deixar bem claro: não suporta "PR", ou seja, alguém com o "papo ruim". Foi em uma de nossas conversas que ela me disse algo que nunca vou esquecer: "Quem não vive para servir, não serve para viver". Penso que a lição mais importante que ela me ensinou foi exatamente esta de tentar fazer o bem às pessoas, mesmo que tais pessoas não tenham sido boas conosco. Sim, uma lição difícil de aprender e de colocar em prática, mas uma lição extremamente importante.

Falar da minha Vó Nega é me recordar de algumas das melhores coisas da infância: o futebol na rua Minas Gerais perto da casa dela, os bolinhos de chuva, o dinheiro para ir à sorveteria, as tardes gostosas em época de férias na "casa da vó". Falar da minha avó é falar de alguém que soube enfrentar com firmeza os dissabores da vida e que sempre procurou fazer as coisas da maneira certa, com honestidade e integridade. Falar da minha avó é falar de uma pessoa que é exemplo de resistência e força, um exemplo sempre útil para os momentos difíceis da vida.

Durante a minha infância, eu confesso que pensava que ela seria eterna. Os anos passados e a vida adulta me mostraram, porém, que o tempo age sobre todas as pessoas. Hoje, quando a vejo em sua casa, com os movimentos lentos, a respiração cada vez mais pesada, a dificuldade para se levantar e as marcas do tempo em seu rosto, não há como não pensar neste destino de todos nós que é o envelhecimento. Minha Vó Nega quase sempre fala, desde que eu me entendo por gente, dos seus problemas de saúde e de como acha que "vai morrer em breve". É algo dela. E eu, como neto, gosto de responder que ela está errada e que vai viver muitos e muitos anos ainda. Respondo dessa forma porque é o que eu realmente desejo, do fundo do meu coração. Quero que ela viva ainda muitos e muitos anos para além destes 78 que ela completou ontem. E isto não é algo que eu apenas "quero" que aconteça, mas que também "sei" que é o que vai acontecer! Porque pessoas como a minha Vó Nega são para sempre, para a eternidade. Porque pessoas como ela sempre deixam a sua marca em nós, seus filhos e netos, pelo seu exemplo e pelos seus ensinamentos. Vó Nega é dessas pessoas que ficam sempre com a gente.

Por tudo isso, só posso dizer: vida longa à Dona Nega! 

Parabéns, Vó!
Nós te amamos!

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