sexta-feira, 22 de julho de 2011

"A polícia é bravo"

Um casal de vizinhos aqui de casa possui um pequeno filho, de nome Marcos Paulo. O garoto não tem ainda nem quatro anos completos, mas é muito esperto, frequenta muito a minha casa, torce pelo Vasco, não pára nenhum minuto, é super bonito, agitado e tem "muita energia", como ele mesmo diz. Um dia desses ele veio até minha casa e ficou assistindo ao jornal comigo. Quando passou uma reportagem sobre a ação do corpo de bombeiros em um acidente de trânsito, Marcos Paulo disse: "Os bombeiros salva as pessoas que machucou nas ruas". Achei a frase super bonitinha. Depois de uns minutos, o jornal passou uma reportagem sobre uma operação policial e, ao ver os policiais na TV, Marcos Paulo logo falou, assustado: "A polícia é bravo... ela prende os homens". Ao ouvir isso fiquei intrigado: o menino fala bem dos bombeiros, mas demonstra medo quando vê a Polícia...
Uns dias depois minha mãe foi ao mercado da rua de cima, acompanhada pelo Marcos Paulo que, aliás, gosta muito da minha mãe. Ao voltarem, minha mãe contou que uma viatura da Polícia passou pela rua, o que deixou o Marcos Paulo assustado. Mais uma vez me perguntei: por que esse menino tem tanto medo da Polícia?
Nas últimas semanas o país acompanhou o caso do desaparecimento e morte do menino Juan, de onze anos, em Nova Iguaçu, Baixada Fluminense, no estado do Rio de Janeiro. Mais recentemente, foi divulgada a conclusão da perícia de que o menino foi morto por quatro policiais militares. Nada mais revoltante, não? A Polícia que deveria proteger as pessoas é responsável pela morte de um menino de onze anos. Que Polícia é essa? 
Ora, os nossos policiais são colocados sob uma pesada rotina de trabalho, com pouca estrutura e baixos salários, além de terem recebido, muitas vezes, uma precária formação. Tudo isso somado à intensa corrupção nas instituições policiais e à crescente violência nos centros urbanos resulta em uma Polícia cruel, preparada para enfrentar uma guerra contra a população e não para protegê-la. Os policiais abusam de sua autoridade, batem, agridem, humilham, matam. Como diria o pequeno Marcos Paulo, "a polícia é bravo", não protege ninguém, mas pratica atos violentos contra a população. Logicamente, é preciso não generalizar, uma vez que há sim bons policiais, contudo, esse recente caso do menino Juan deve fazer-nos refletir sobre qual papel a Polícia tem desempenhado em nossa sociedade. 
Não sou inimigo da Polícia, nem seria louco para sê-lo, reconheço sua importância e sua necessidade, porém, a Polícia que temos hoje está longe de ser a ideal. Enquanto os indivíduos corruptos não forem, definitivamente, banidos das corporações e as condições de formação e de trabalho dos policiais não melhorarem, a nossa Polícia será apenas a Polícia que prende, mata e provoca medo em crianças pequenas. Precisamos de uma Polícia que nos proteja, não de uma que nos machuque.

2 comentários:

  1. Criança tem algo que já perdemos em nossa (auto)domesticação, que é sensibilidade de perceber as coisas e formular concepções autônomas e sinceras. Mas não sei se a questão é apenas excluir os policiais corruptos, me parece que o problema está muito mais incrustrado nas raízes de uma instituição disciplinar que tem o uso da violência legalmente reconhecido. Essa transferência de poder, sobretudo da força a outrem, é a grande complexidade da governabilidade. Os países mais pacíficos são os com contingente policial menor. Em todo caso, fico do lado do Marcos Paulo e do Tony Belloto: "policia para quem precisa, policia para quê precisa?"

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  2. Os países mais pacíficos são também os que possuem a taxa de alfabetização maior e o índice de pobreza menor, ainda assim, não ousaria tal comparação levianamente. Mas certamente a quantidade de policiais não tem tanta importância nisso. Eu diria que o contingente policial ser menor é uma consequência de o país ser pacífico, não o contrário.
    A polícia brasileira é violenta sim, mas ainda não existe lei que reconheça ou admita essa violência. Do contrário não teria sido pedida a prisão preventiva dos quatro policiais no caso do menino Juan.
    O problema é que a polícia, especialmente a estadual, ainda está abastada de “analfabetos”, gente intelectualmente despreparada. Digo “intelectualmente” porque a polícia especializada, que é a mais tecnicamente bem preparada, é tecnicamente a mais violenta. Mas eu fico intrigado: o governo quer policiais que pensam ou cães de guarda que obedecem?...
    Pode-se dizer sim que é uma violência reconhecida de certa forma, mas não legalmente, sim através da pouca instrução dos que estão dentro da instituição e até mesmo dos que estão fora dela. Já vi diversas vezes “cidadãos de bem” com o discurso estúpido de que “a polícia tem que bater mesmo” ou que “deveria matar todos os bandidos”. Em contrapartida, no meio policial, a maioria se vangloria disso. Como se espancar um infeliz qualquer fosse um grande triunfo ou uma amostra de coragem e vigor policial. Quanto mais “bravo”, mais competente. É propriamente o cúmulo da estreiteza mental; “oligofrenia perversa”, eu diria. (Penso que a ignorância e a parvoíce, de fato, não têm limites).
    Eu gostaria muito também que não precisasse existir a polícia. Gostaria também que não existisse crime, miséria, fome, doença, gente burra, Restart... Enfim. A diferença é que a polícia é um mal necessário, ainda.
    Ademais, suponho que essa questão deveria ser muito mais do que um belo discurso arrojado envolto num pensamento estreito. É verdade que essa nossa polícia está longe de ser a ideal mesmo, Rodrigo. Mas está longe também de ser completamente inútil, Munhoz. Deveria ser melhorada, não eliminada.

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